quinta-feira, abril 25, 2024
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Alimentos que salvam

Como é de conhecimento geral, o segmento de alimentos industrializados domina o mercado para animais de estimação com larga margem de vantagem. O faturamento desse setor é calculado na ponta do lápis pela Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet). “Estima-se que o setor de pet food foi responsável por 67,6% dos 19 bilhões de reais faturados com mercadorias e serviços pelo setor pet em 2016”, informa o presidente executivo da Abinpet, José Edson Galvão de França. 

Os alimentos coadjuvantes pertencem ao setor do pet food e estão em franca expansão. São produzidos por uma quantidade crescente de indústrias e cobrem uma ampla gama de necessidades terapêuticas. Ajudam a tratar alergias, diabetes, males cardíacos, gastrointestinais, hepáticos, renais, urinários e de mobilidade. Existem também formulações para proteção da saúde oral e para combater a obesidade. Até alimentos para evitar bolas de pelos em gatos são encontrados no mercado. “A função dos alimentos coadjuvantes é dar suporte ao tratamento clínico estabelecido pelos médicos veterinários”, explica Galvão de França. “Por exemplo, para auxiliar no combate à doença renal, o alimento tem menos proteína bruta ou, se o problema for hepático por acúmulo de cobre, a presença desse material é diminuída”, ilustra ele. “Já para o animal obeso são acrescentadas fibras e, em casos de disfunção cognitiva, aumenta-se a quantidade de vitamina E”, acrescenta. Nenhum alimento coadjuvante contém ingredientes farmacologicamente ativos. Essa é a regra instituída pela Instrução Normativa 30, de 2009, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. O texto da instrução diz: “O alimento coadjuvante é um produto destinado exclusivamente à alimentação de animais de companhia com distúrbios fisiológicos ou metabólicos, composto por ingredientes ou matérias-primas ou aditivos capazes de atender integralmente às suas exigências nutricionais específicas, com formulação incondicionalmente privada de qualquer agente farmacológico ativo.”

EXPANSÃO À VISTA

Tudo indica que a próxima década será de crescimento para os alimentos coadjuvantes. Há três bons motivos para isso. “Um é a longevidade crescente dos animais, o que resulta em mais doenças para tratar”, menciona Marco Antonio Gioso, professor livre docente da FMVZ – USP, palestrante internacional, coach e consultor empresarial. “O segundo motivo é a tendência de cada vez mais as pesquisas encontrarem maneiras de ajudar a tratar doenças por meio da dieta alimentar”, pondera. “Finalmente, há a expectativa de que a população de animais continue a aumentar nos próximos anos.”

NA GÔNDOLA

O maior erro dos lojistas é expor alimentos coadjuvantes ao lado dos de uso comum”, opina Sergio Lobato, médico veterinário consultor e palestrante em Gestão da Inovação em Medicina Veterinária. “Essa linha de produtos tem força própria e merece ocupar um espaço só dela”, enfatiza ele. “Deve ser exposta transmitindo a ideia de solução dietética para os problemas de saúde dos animais.” Gioso concorda: “O recomendável é ter uma seção ou gôndola exclusiva para os produtos vendidos com prescrição, caso dos alimentos coadjuvantes.” Lobato comenta que simplesmente colocar alimentos coadjuvantes ao lado dos tradicionais é contraproducente. “Ficam parecendo apenas ração mais cara”, avalia.

ESTOQUE ENXUTO

Quais marcas de alimentos coadjuvantes ter na loja? Esse é um belo desafio. Já existem diversos fabricantes competindo e a tendência é surgirem ainda mais. Por um lado, Galvão de França lembra que os clientes devem ter sua necessidade de consumo atendida. Isso porque o comprador em potencial que busca uma marca, se não a encontrar, dificilmente voltará à loja. Na mesma linha de pensamento, Gioso afirma: “Ter tudo no petshop é um diferencial competitivo.” Mas ele próprio considera que estoque enorme só é viável em lojas com grande fluxo de saída de mercadorias. “Nunca compre o que não tem certeza de vender”, costuma orientar. Como, então, trabalhar com estoque enxuto e não perder vendas por falta de mercadoria? Lobato tem uma sugestão. “Faça um levantamento para saber quais marcas costumam ser indicadas nas clínicas veterinárias da região e não se esqueça de renovar periodicamente a pesquisa”, diz.

SÓ COM RECEITA

Apesar de não existir legislação específica para a comercialização dos alimentos coadjuvantes, é consenso de que eles só devem ser entregues aos clientes mediante apresentação de receita assinada por médico veterinário. Assim, se aparecer na loja algum interessado em alimento coadjuvante sem trazer receita, não deve levar a mercadoria. “A prioridade dos estabelecimentos e da indústria deve ser a saúde do pet”, lembra Galvão de França. “Em caso de cliente que procura alimento coadjuvante sem ter receita, a recomendação é encaminhá-lo a um médico veterinário, esclarecendo sobre a importância da prescrição para o bem-estar do animal”, diz. Dessa maneira, evita-se que animais sejam alimentados inadequadamente e que fiquem sujeitos a algum efeito desastroso. “Não são raros os casos de cães e gatos que adoecem por consumo de alimento coadjuvante inadequado sem prescrição”, alerta Gioso. Ao fornecer a mercadoria, o lojista deve reter a receita ou, pelo menos, ficar com uma cópia. “Com base no Código Civil, a recomendação é guardar os documentos por 5 anos”, menciona Lobato, que cita também a possibilidade de digitalizar os documentos. 

Dessa maneira, tanto o lojista quanto seu responsável técnico estarão protegidos se tentarem responsabilizá-los caso o consumo inadequado do alimento tenha causado problema ao animal. O responsável técnico ao qual nos referimos é o médico-veterinário, profissional que todo pet shop deve manter obrigatoriamente, conforme a resolução 1.069, de 27 de outubro de 2014 do Conselho Federal de Medicina Veterinária.

CAÇA AO CLIENTE

Normalmente, o consumo de alimento coadjuvante ocorre por longo período. Conquistar e manter esse tipo de cliente significa contar com uma duradoura fonte de receitas. Vale a pena, portanto, desenvolver estratégias para conquistar e fidelizar os compradores de alimentos coadjuvantes. Uma boa estratégia para conquistá-los é divulgar, nos estabelecimentos veterinários da região, que a sua loja está vendendo alimentos coadjuvantes. Lobato sugere criar um programa de fidelidade para os veterinários. “Pode ser estabelecida uma tabela que pontue as indicações dos veterinários, com direito a benefícios e vantagens, sempre respeitando o código de ética da classe”, sugere. “Um tipo de vantagem que pode ser oferecida aos veterinários são descontos na compra de alimentos e medicamentos para os animais deles.” 

Quanto à manutenção da clientela, uma ideia é poupá-la do trabalho periódico de correr atrás das receitas médicas. “Quando uma receita está prestes a vencer, o lojista pode solicitar a renovação diretamente ao veterinário, desde que o cliente autorize”, sugere Gioso. “Caso a intimidade não chegue a tanto, o lojista pode lembrar o cliente com alguma antecedência quando chegar o momento de pedir nova receita”, sugere. Com base na frequência de consumo e na porção servida ao animal, dá para calcular quando o cliente vai precisar reabastecer o estoque. “Muitos lojistas entregam automaticamente o alimento na casa do consumidor mesmo sem terem recebido pedido e depois mandam a conta”, comenta Gioso. “Os clientes costumam gostar; é uma tarefa a menos para eles durante o mês.”

PROMOÇÕES

Chame a atenção para a seção de alimentos coadjuvantes divulgando-a com um vídeo num monitor de TV próximo ao caixa”, propõe Gioso. “Outra possibilidade, que mostra muita seriedade, é manter no balcão um guia em iPad com informações sobre os alimentos por prescrição e os riscos da compra sem receita”, complementa. Campanhas que estimulem a compra continuada podem ser feitas com clientes cujas receitas de médico veterinário se encontram no prazo de validade. “Uma possibilidade é criar um clube de vantagens para compras continuadas na loja, com descontos progressivos”, sugere Lobato. É válido também estimular compras cruzadas. “Por exemplo, pode-se dar desconto em comedouros e bebedouros aos clientes que compram alimento coadjuvante”, indica Lobato.

ÉTICA E EQUIPE

Os conhecimentos do responsável técnico da loja podem ser muito úteis ao se definir a estratégia a ser adotada com a linha de alimentos coadjuvantes. “Troque ideias com ele e avalie as possibilidades de trabalho para cada alimento coadjuvante”, sugere Lobato. “O responsável técnico está habilitado também a instruir os atendentes sobre a correta comunicação com os clientes a respeito dos benefícios, forma de uso e indicações dos alimentos coadjuvantes.” “Ter uma equipe bem informada sobre os benefícios de cada mercadoria dá um importante destaque à loja”, reforça Gioso. “O vendedor que sabe tudo sobre um produto transmite confiança e vende muito mais”, assegura o especialista. “Todo esse conhecimento em um ambiente ético é utilizado para esclarecer dúvidas, nunca para receitar, papel que cabe somente ao médico veterinário”, lembra Gioso. Lobato aconselha os lojistas a promoverem treinamento progressivo de seus funcionários utilizando as equipes técnicas dos fornecedores. “Podem ensinar sobre as patologias tratadas pelos alimentos coadjuvantes e sobre as formulações desses alimentos com linguagem acessível, fácil de entender”, exemplifica. Gioso vê uma excelente oportunidade de a loja se diferenciar da concorrência por meio de atendentes que dão boas informações. “Geralmente, as equipes são pouco ou nada treinadas”, opina. “A baixa qualificação de vendedores ou colaboradores é comum no Brasil.” Ele constata desinteresse muitas vezes por parte dos próprios responsáveis pelos pet shops. “Quantos lojistas vão a congressos, cursos e palestras ou se informam sobre como funciona cada alimento, leem a bula, tiram dúvidas com o promotor, a empresa fabricante ou com o próprio responsável técnico da loja?”, cutuca. “E quantos lojistas já tentaram saber mais sobre nutrição e as doenças que os alimentos terapêuticos ajudam a tratar?


MONITORAR O LUCRO

Faça muita conta, item por item, produto por produto, avalie a margem de contribuição de cada mercadoria”, recomenda Gioso. Ele constata que a maioria dos lojistas não gosta de levantar dados internos, fazer projeções financeiras, avaliar o lucro. “Dizem que não têm paciência ou que lhes falta tempo”, afirma Gioso. “O resultado é que poucos conseguem se sobressair e ter sucesso.”

PÚBLICO-ALVO

O potencial de consumo de alimentos coadjuvantes para cães está principalmente nas classes A (renda acima de 20 salários mínimos) e B (de 10 a 20 salários mínimos). Para esses grupos, o gasto mensal com cão é de 2,4% e 3,2% da renda, respectivamente, segundo estudo da Abinpet. No caso de gatos, espécie de manutenção mais barata, pode-se considerar cliente potencial também a classe C (4 a 10 salários mínimos). Para ela, um felino custa 2,8% da renda, em média, em vez de 7% de um cão. “É importante que o lojista selecione as mercadorias que coloca à venda de acordo com o poder aquisitivo do seu público”, sugere Gioso. As classes D (renda de 2 a 4 salários mínimos) e E (até 2 salários mínimos) estão praticamente fora do consumo de alimentos industrializados para pets, o que é uma pena por ser essa a melhor opção nutricional para os animais. “A situação poderia melhorar se os impostos não fossem tão elevados; mais de 50% do preço final refere-se a impostos”, lamenta Galvão de França.