terça-feira, abril 30, 2024
Aves e Aquarismo

Mercado de Silvestres e Exóticos: setor com muito potencial

Veterinários especializados comentam avanços, dificuldades e desafios do segmento de pets não convencionais e de aves no Brasil

Fotos: Arquivo Pessoal/Divulgação
Steffanie Matos (à esq.) e Larissa Amorim: veterinárias sócias da clínica Silvet, do Rio de Janeiro-RJ

Eles chamam a atenção. São coloridos, diferentes, pets especiais para aqueles que querem ter um pouco da fauna silvestre ou até de outros países, em casa. E os números do setor expressam crescimento de interesse por animais não convencionais e silvestres. “O Brasil tem um dos maiores mercados pet do mundo e, neste cenário, o mercado de animais silvestres e exóticos é o que mais cresce proporcionalmente a cada ano. O número de aves ornamentais já supera o de gatos domésticos por exemplo, e o mercado de pets não convencionais ainda tem muito potencial para se desenvolver ainda mais”, ilustra Steffanie Matos, médica-veterinária pós-graduada em gestão hospitalar e gestora de negócios do mercado veterinário, sócia da única clínica do Rio de Janeiro-RJ exclusiva em atendimento de silvestres e exóticos, a Silvet, inaugurada há 8 meses. Nesse tempo, percebeu-se que as calopsitas, porquinhos da índia, coelhos, jabutis e papagaios representam 70% dos clientes, em ordem decrescente. “Calopsitas lideram não só entre as aves, mas é o nosso maior número de atendimentos, 25% do total. Mas se dividirmos entre aves, mamíferos e répteis, os mamíferos estão com 42%, bem próximos às aves com 46%, tendo os porquinhos da índia liderando os mamíferos. Já os répteis são 12% dos atendimentos”, detalha Steffanie, cuja sócia, a médica-veterinária especializada em animais silvestres e exóticos e em odontologia orofacial de roedores e lagomorfos, Larissa Amorim, atua na área de silvestres há mais de 12 anos. “Meu ingresso nessa área foi paixão à primeira vista! Tive contato no segundo ano de faculdade, e tive a certeza de que era isso que queria. A falta de rotina é o que mais me chamou atenção”, compartilha Larissa.

Foto: Divulgação

Experiente na área, atuando há quase 23 anos como médico-veterinário, o proprietário da primeira clínica especializada em silvestres e exóticos da América Latina, a Wildvet & Wildpet, de São Paulo-SP, André Grespan é um pioneiro do setor. “O que me fez entrar nessa área foi minha paixão pelo diferente, minha curiosidade em aprender sobre animais (todos). Passei praticamente toda a minha vida acadêmica e depois de formado trabalhando com silvestres e exóticos. Montei a Wildvet, numa época que ninguém falava em clínica especializada em nenhuma área”, comenta André, que aponta atender mais de 60% de aves em sua clínica, com grande destaque aos psitacídeos.

Foto: Arquivo Pessoal

Já para Catharina Fonseca, da Vet Exóticos Clínica Veterinária, em Camboriú-SC, clínica inaugurada em 2021, o mercado de animais não-convencionais é crescente para os veterinários, porém, ainda em ritmo reduzido e cheio de desafios. “É preciso conscientizar os tutores de que estes animais podem receber o mesmo cuidado que os pets convencionais. Diferente do mercado de aves, pois existem muitos criadores, eventos do setor e muito investimento em genética, fazendo com que os tutores e criadores busquem atendimento especializado. Além disso, o mercado de aves caminha juntamente com o mercado pet em geral. A grande variedade de espécies, tamanhos, cores e personalidades, ajuda muitas pessoas a encontrarem um amigo de penas ideal”, opina. “Felizmente, temos visto muito mais proprietários preocupados. A consciência está mudando”, completa Catharina, que em sua clínica, atende, em sua maioria, aves, lagomorfos (coelhos) e pequenos roedores. “Entre os clientes que têm aves, os psitacídeos estão em maior quantidade”, acrescenta.


Desafios

André aponta o tráfico de animais e a falta de incentivo aos criadores e comércio legal desses animais como grandes entraves ao crescimento desse setor no Brasil. “Existe um excesso de ideologia por conta de órgãos ambientais (que deveriam regulamentar/fiscalizar e não coibir novos empreendimentos/criadores). Temos um mercado que quer se expandir, tem muito espaço para isso, mas por conta de algumas políticas e ideologias não vai para frente, o que acaba fomentando o tráfico (este não tem regras e não tem leis – corre solto). Animais do tráfico em geral são negligenciados e mal manejados desde o início. É ruim para os animais é ruim para os clínicos”, critica o médico-veterinário. Já Larissa destaca que a escassez de conteúdo científico na área, quando comparada à medicina de cães e gatos, é um grande desafio. “Faltam livros, artigos, e até parâmetros fisiológicos normais para algumas espécies. Além disso, faltam laboratórios investindo em medicamentos e produtos específicos para esses pets. Infelizmente, muitas vezes nos deparamos com falta de produtos específicos, que só são encontrados fora do Brasil ou são voltados para pequenos animais”, diz. Steffanie concorda e aponta que, embora instituições de ensino e indústrias farmacêuticas têm investido em conhecimento na área, o mercado ainda tem muito o que evoluir. “O mercado de aves está mais desenvolvido e há mais investimento na área, principalmente, por parte da indústria farmacêutica. Vejo o mercado de pequenos mamíferos exóticos, apesar de todo o potencial e crescimento claro, precisando de maior atenção. Ainda mais para quem está fora de São Paulo, que é muito mais desenvolvido e tem muito mais amantes desses pets. Mas acredito que o Rio de Janeiro tenha um grande potencial, ainda pouco explorado”, completa. Catharina aponta que clinicar na área por si só já é um grande desafio. “O mercado é desafiador, é seletivo. Clinicar, estudar, se manter aperfeiçoado, atualizado e sobreviver requer muita dedicação, saúde e tempo. Também há falta de incentivo de universidades para essa área, o que desestimula os estudantes. A dificuldade em encontrar materiais para estudo, cursos, estágios, também são fatores que contribuem pela menor procura de veterinários nessa área”, diz a veterinária, que sempre foi apaixonada por animais exóticos e esteve rodeada por eles, desde pequena. “Para trabalhar com animais que não sejam cães e gatos, é preciso entender que não temos uma rotina, é desafiador, precisamos estudar todos os dias, pois o número de espécies é gigantesco! Temos que praticar muito. Precisamos ter jogo de cintura para saber lidar com as diversidades, auto-conhecimento para saber seus limites, persistência e, claro, amor e respeito pelos animais”, completa.

Mercado Vet

A maior mudança que tem acontecido no setor, segundo Steffanie, está na forma como os tutores vêm lidando com esses pets, cuidando da saúde deles como membros de suas famílias e buscando atendimento cada vez mais especializado. Larissa, concorda. “Hoje os tutores sabem da importância de levar seu pet não convencional ao veterinário especializado. E hoje, nós, veterinários que nos dedicamos a essa área, consequentemente estimulamos aos jovens que estão graduando, fazendo com que vejam que é possível atuar na área”, comenta Larissa, que enxerga uma evolução na procura pela especialidade entre veterinários em relação ao tempo que iniciou a sua carreira. André também percebe maior procura pela medicina de animais silvestres e exóticos. “Além de possibilitar uma renda extra dentro da clínica, essa especialidade se tornou algo chamativo dentro das redes sociais e muitos colegas descobriram essa fórmula para se destacar na profissão”, opina o veterinário, que faz um alerta para o veterinário que pretende se especializar: “essa área é multidisciplinar, e o grande erro de quem quer trabalhar nela é menosprezar quaisquer fontes de aprendizado que não seja exclusiva de animais silvestres e exóticos, seja a clínica de pequenos animais e até mesmo a clínica de grandes animais e de produção. Tudo pode ser utilizado a seu favor, todo conhecimento é importante, tudo que se aprende poderá ser adaptado para estes animais tão diferentes”. Assim, continua André, para poder trabalhar com esses animais é preciso gostar de estudar. “Ao contrário dos animais domésticos, que os estudos e informações estão muito bem-organizadas e sólidas, no meio de animais silvestres e exóticos as informações estão soltas e espalhadas por aí, cabe a você juntar tudo e estudar sempre, pois sempre haverá um novo diagnóstico ou tratamento”, finaliza.

Por Samia Malas