sábado, abril 27, 2024
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PETS NÃO CONVENCIONAIS: DESAFIOS, TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS

Confira a opinião de especialistas sobre um dos setores pet que mais crescem no Brasil e no mundo

Fotos: Rocheli Tugera por Pixabay

A expansão do segmento de exóticos e silvestres, os ditos pets não convencionais, é uma das formas que o Brasil tem de crescer ainda mais no setor pet. Porém, também é um nicho que ainda enfrenta desafios e dificuldades para crescer. Segundo levantamento feito pelo médico-veterinário Jamerson Jessé Stein, em seu trabalho publicado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (“Análise do mercado de animais não convencionais criados como animais de estimação no Brasil”), realizado em 2022, para aquecer esse mercado, é preciso inserir, de maneira sustentável, espécies nativas com valor comercial no mercado interno e externo. “Essa já é uma realidade percebida em países desenvolvidos e nas economias emergentes, através da implantação de criadouros de animais silvestres para consumo e comercialização”, aponta Jamerson. Ainda segundo ele, cerca de 43% da população total de animais de estimação existentes no Brasil são de animais não convencionais, caracterizados por aves canoras e ornamentais, peixes ornamentais, répteis e pequenos mamíferos. Segundo Larissa Rocha, Especialista em Assuntos Regulatórios da Poytara, este mercado tem tido avanços significativos nos últimos anos.

Foto: Arquivo Pessoal


“Ele vem ganhando força, espaço, produtos específicos e atendimento personalizado. Um ponto muito positivo é em relação aos tutores, que aos poucos estão tendo consciência que pets não convencionais possuem um comportamento diferenciado, características únicas e necessitam de cuidados especiais, que eles, apesar de não terem todo conhecimento técnico, se propõem a pesquisar e respeitar sobre seus hábitos alimentares, comportamento, habitat e procuram por um atendimento veterinário especializado. Aliado a isso, vemos que os profissionais que atuam com pets não convencionais têm se capacitado tecnicamente e estão entendendo as implicações legais e os impactos sobrea saúde pública, conservação e bem-estar animal. Se continuarmos neste caminho, será um mercado que crescerá ainda mais nos próximos anos”, revela Larissa.

Foto: Arquivo Pessoal


Catharina Fonseca Coelho, médica-veterinária pós-graduada em Clínica e Cirurgia de animais exóticos e selvagens da clínica Vet Exóticos, de Camboriú-SC, aponta o crescimento desse mercado nos últimos anos como exponencial. “Em muitos casos, no local onde as pessoas moram, não permitem a convivência de cães e gatos, isso faz com que elas busquem outros tipos de parceiros exóticos. Com isso, as pessoas têm pesquisado mais sobre tipos de espécies pets, e procuram profissionais qualificados para atendê-los”, diz. Catharina também destaca a importância do fomento de criatórios regularizados e uma fiscalização efetiva como pontos importantes para impulsionar o mercado. “A capacitação de profissionais é fundamental para suprir às necessidades da população, diminuindo a propagação de informações incorretas, realizando procedimentos de forma correta e trazendo maior qualidade de vida e conforto aos pacientes”, acrescenta.

Foto: Arquivo Pessoal

Felipe Bath, médico-veterinário e proprietário do Hospital Birds e Cia, do Rio de Janeiro-RJ, também descreve esse mercado como crescente, assim como todo o mercado pet em geral, que cresce constantemente e sempre acima da inflação, tanto na parte de produtos veterinários, suplementos, rações e medicamentos, como em serviços. “Porém, no mercado de exóticos e silvestres esbarramos em alguns complicadores, barreiras que, quando somadas, dificultam o seu crescimento de uma forma mais exuberante. Por exemplo, alguns animais exóticos que são comumente vistos, como o agapornis, são permitidos desde que tenham nota fiscal e controle do Ibama no estado de São Paulo”, opina. Ainda segundo ele, os grandes avanços tecnológicos, as equiparações com o crescimento de cães e gatos e o surgimento da especialidade da especialidade, são grandes conquistas do setor. “É uma cópia do que tem acontecido na medicina humana, mas vem chegando também no mercado de exóticos e pets não convencionais, em termos de alimentação, medicação e cirurgias avançadas que vêm sendo feitas etc.”, diz.

Foto: Arquivo Pessoal

Segundo Luiz Fernando dos Reis Albuquerque, CEO da Megazoo, o mercado de animais não convencionais avança mais que o de cães e gatos no Brasil e no mundo. “Muitas lojas estão criando suas áreas de safáris visto que o movimento de exóticos vem se consolidando no país. Um dos grandes reflexos é o número de veterinários que hoje buscam especialização na área”, aponta.

DESAFIOS

Segundo Jamerson, o dinamismo deste mercado e o seu grande potencial de crescimento, exige uma abordagem criteriosa. “O Brasil possui a maior biodiversidade do planeta e sua riqueza natural é imensurável. Segundo Amaral (2016), essa grande diversidade biológica demonstra o potencial do mercado e a importância na utilização da criação comercial sustentável, como ferramenta de combate ao mercado ilegal, de conservação, manutenção e reserva de recursos genéticos exsitu. Conforme Associação Brasileira de Criadores e Comerciantes de Animais Silvestres e Exóticos (ABRASE, 2012), atualmente o grande desafio do segmento pet de animais silvestres e exóticos tem sido comprovar para a sociedade que os criadouros e as empresas do setor estão aliados, e que são os principais interessados na preservação do meio ambiente e na busca pela sustentabilidade”, enfatiza Jamerson em sua pesquisa. Larissa acrescenta que a falta de conhecimento, conscientização e responsabilidade de alguns tutores também está entre os principais desafios desse mercado. “Além dos cuidados especiais, o maior desafio em ter um animal exótico ou silvestre é adquirir a documentação necessária para legalização. Para isso, a compra deve ser feita em lojas ou criadouros especializados e autorizados. Mas, infelizmente, o tráfico ilegal de animais exóticos e silvestres ainda é algo presente em nossa sociedade, por isso a conscientização da população sobre o tema é primordial”, aponta. Ainda segundo Larissa, outro desafio do setor é encontrar medicamentos e profissionais especializados em regiões mais afastadas dos grandes centros para atender os pets não convencionais. “Precisamos estar alinhados em todos os setores envolvidos nesta cadeia para que este mercado continue crescendo. Como: fiscalização dos órgãos competentes e atualizações das legislações, profissionais clínicos capacitados, criadores legalizados e indústrias produtoras de alimentos e medicamentos específicos para todas as espécies de exóticos e silvestres liberados para comercialização”, acrescenta Larissa.

CRIATÓRIOS E CONFLITOS: ENTENDA O PANORAMA
Os criadouros de animais silvestres desempenham um papel importante na cadeia produtiva destes animais como pet, sendo de fundamental importância entender a sua relevância na reprodução e conservação de espécies ameaçadas de extinção, aponta Jamerson Jessé Stein. “A grande biodiversidade existente no Brasil é um facilitador para a retirada ilegal de exemplares de animais silvestres da natureza, aliado a isso, a crescente demanda por animais de estimação silvestres e a falta de uma política de criação sustentável, contribui ainda mais para abastecimento do mercado ilegal. Segundo o Ibama o papel da criação de animais silvestres em cativeiro, além de diminuir a retirada destes animais da natureza, pode contribuir para a reposição de populações que seguem no caminho da extinção. “A criação legalizada da fauna em cativeiro, ou sua extração sustentável, pode auxiliar na redução da pressão aos animais de vida livre, uma vez que o produto chega ao mercado por vias legais”, aponta o veterinário.
Segundo levantamento feito por Jamerson, os empreendimentos de criação e comercialização de pets silvestres são os que mais sofrem pressão e impasses na legislação. Ele explica que em 2007, o Conama definiu a Resolução nº 394, cuja norma foi a que mais causou impacto na criação comercial da fauna brasileira. Esse regulamento estabelece critérios e competências para a publicação da lista de animais da fauna silvestre nativa, definida como ‘lista pet’, que poderiam ser criados e comercializados como animais de estimação, porém, o Ibama não aderiu à criação dessa lista pet, aprovando apenas sessenta espécies para comercialização. Ainda segundo o pesquisador, a inexistência dessa lista acarreta sério impacto sobre os processos de autorização de empreendimentos de fauna. Com base no art. 6º, da Instrução Normativa nº 169/08, fica suspenso o cadastro de novos criadores comerciais com finalidade de animal de estimação até que ela seja publicada.

Já Catharina diz que o fato de muitas pessoas ainda não estarem conscientes que pets não convencionais merecem os mesmos cuidados que os pequenos animais (cães e gatos), é um grande desafio. “Com a tecnologia e as adaptações presentes hoje, nos possibilitam realizar exames e procedimentos até nos menores dos pacientes! Educar a população para buscar atendimento especializado é um trabalho gradativo, mas ainda pode ser difícil de encontrar em algumas regiões do nosso país”, completa.
Já Felipe aponta um outro desafio, o de se trabalhar sem estrutura. “Quem tem uma boa estrutura, um hospital, centro de especialidades, etc., sai na frente. Trabalhar sem estrutura é muito ruim”, diz.
Para Luiz Fernando, o criador de animais não convencionais demanda de uma melhoria na legislação vigente para ter mais segurança jurídica. “As associações como a FOB, a MAPI, a ABRASI, vêm buscando isso junto ao MAPA e Ibama e nos governos estaduais também. Com essa segurança jurídica acreditamos que esse mercado tem tudo para ficar mais exponencial ainda”, revela.

TENDÊNCIAS

No setor pet convencional já se tem muitas tendências em andamento que se estenderão para o setor de exóticos e silvestre de forma natural, aponta Larissa. “As principais tendências de mercado e novidades envolverão o ecossistema pet, a área de alimentação e a saúde e bem-estar animal. As empresas que saírem na frente trazendo soluções, produtos e serviços que atendam às necessidades nestas áreas ganharão destaque”, opina Larissa, que aponta novas formas de alimentação saudável para pets, sustentáveis e mais naturais, como uma tendência forte no setor. “Cito como exemplo o desenvolvimento e a utilização de proteínas consideradas ‘sustentáveis e amigas do meio ambiente’ como a BSF (mosca soldado negra), grilo e spirulina, estão sendo inseridas na elaboração de rações super nutritivas”, diz.
Hoje, empresas como a Megazoo, têm um mix de produtos para atender quase todos os animais e suas necessidades. “Não só na parte nutricional, mas também em higiene, beleza e suplementos”, diz Luiz Fernando.
Já Felipe aponta que não vê grandes tendências, mas sim, que esse mercado está chegando cada vez mais no nível de ponta. “São ações pontuais que são feitas pela indústria e veterinários que acabam fazendo a diferença. Um somatório, um conjunto de fatores para esse crescimento”, diz Felipe.

Por Samia Malas