quinta-feira, março 28, 2024
Banho e Tosa

Cães trabalhosos no banho e tosa: como lidar?

Cães medrosos e traumatizados precisam de uma dose extra de carinho, calma e muita conversa na hora do atendimento – Foto: PavelRodimov/iStockphoto.com

Saiba o que fazer quando aparecem cães agitados, pouco acostumados com o banho e tosa, grandes, mordedores, medrosos e até traumatizados no seu pet shop

Quando falamos em banho e tosa, imagino que na mente da maioria das pessoas vem aquela imagem de cães lindos, cheirosos e fofinhos, que temos vontade de abraçar e não largar nunca mais. E isso realmente é uma realidade nos centros estéticos. Mas gostaria de apresentar um outro lado que constantemente estamos expostos e que exige total reorganização de procedimentos para atender essa turminha. Assim como os seres humanos, cada cão tem a sua personalidade, que dita como será o seu atendimento e, muitas vezes, exige cuidados extras do profissional de estética que irá atendê-lo. Cães também trazem instintos naturais de seus ancestrais, ou seja, os que têm linhagem caçadora com certeza serão mais agitados, exigindo mais atenção do groomer. Em alguns casos precisamos até de ambientes separados para atender um cão em específico. Já atendi diversos cães que viam outros cães como presas. E quando esses cães são enormes a melhor coisa é não confiar apenas na sua força de segurar ou em uma coleira, mas sim, mudar para uma sala solitária para realizar os procedimentos. Outras situações que podem criar extrema atenção seriam no atendimento de cães idosos, pois além do corpo do animal necessitar de cuidado especial, o tempo do procedimento precisa ser reduzido. Tudo isso para diminuir ao máximo seu estresse e cansaço no pet shop. Filhotes ou cães pouco acostumados também entram nesse perfil, pois eles não têm a mínima noção do que está acontecendo com eles. Podem pular sem parar ou querer fugir da mesa a todo instante. Os medrosos e traumatizados precisam de uma dose extra de carinho, calma e muita conversa, pois a única coisa que eles têm certeza é que não estariam ali por vontade própria. E tudo isso sem falar dos mordedores (risos). Confesso não ter muito medo de levar mordidas, já levei tantas que já perdi a conta, mas preso pela saúde de todos que estão ao meu redor, e friso a importância de se prevenir das mordidas, pois afinal, nosso corpo é nossa ferramenta de trabalho, principalmente as mãos, que precisam estar 100 % para que possamos trabalhar e realiza procedimentos em outros animais com eficiência. Até porque, se você tiver uma inflamação ou tomar pontos por conta de uma mordida, haverá cancelamentos na sua agenda. 

Para que nada disso aconteça no seu banho e tosa, a seguir, vou ensinar como agir nessas situações e como abordar o cliente, dono desse cão “mais difícil”.  

Pare e pense!

Trabalhar com esse “grupo de cães especiais” exige primeiramente aceitação por parte do profissional de estética. Nosso dia a dia está cercado de instrumentos altamente cortantes, afiados, produtos químicos, água, secadores, enfim, muitos instrumentos que podem prejudicar um animal. Assim, antes de aceitar um cão difícil no seu banho e tosa, é necessário ter ciência do risco, e saber se há uma necessidade de um profissional auxiliar nos procedimentos. Também existem profissionais que não aceitam o animal nem mesmo com auxílio de alguém, e eu respeito essa opinião, afinal, cada uma sabe até onde pode ou consegue ir. Se a decisão do profissional for por atender esses animais, deixarei dicas que como realizar os procedimentos da forma mais segura possível, para o cão e o groomer também. Eu particularmente aceito esses cães desafiadores. Penso que posso ajudar eles da melhor forma possível, sei que farei o possível por ele. Me sinto aliviada de saber que aquele cão terá o serviço de banho e tosa necessário e feito por alguém que está disposto a se adaptar a ele. 

Agitados demais

Cãezinhos alegres, saltitantes, abanadores de rabo, reboladores, são uma farra só. É apaixonante receber toda essa alegria em nosso pet, mas, por outro lado, esses cães exigem cuidados redobrados por serem ligados no 220v. Uma boa tática, que é bem difícil de ser feita, mas funciona, é tratá-los com indiferença. Eu sei, além de ser horrível, e quase impossível resistir a tanta gostosura, mas acreditem, é infalível. Não estou dizendo que é milagrosa, mas resolve muito o excesso de felicidade de alguns animais. Quando sei que vou receber esses elétricos, ou até mesmo quando se trata de um cliente novo, tento não demostrar o quanto aquilo é maravilhoso de se ver. Sabe quando a criança levou uma bronca da mãe e não está querendo conversa? Aí a mãe vem com um sorvete perto e começa uma conversa e a criança fingi não estar nem ai… só para não dar o braço a torcer? É mais ou menos isso (risos). Tem uns que eu não posso nem olhar nos olhos que a farra começa. Então permaneço firme e séria com ele. Não estou falando brava, e sim indiferente, tipo “não estou nem percebendo você aí”. Como eles não recebem a mensagem de confirmação do seu ataque de gostosuras eles ficam quietos, atentos, prestando atenção se a gente vai ceder a todo charme. É gradativo, mas a cada visita ele vai entendendo mais, e você pode ir recompensado por ter aceitado seu comportamento sério durante o procedimento. 

Você pode criar o momento do prazer. Assim que acabar a tosa, por exemplo, você pode brincar uns minutinhos com ele ou na hora do perfume, quando achar melhor. 

Assim ele pode extravasar, e você, aproveitar o carinho delicioso, e ainda educar ele para saber quais são os momentos que são para brincas e quais não são. 

Pouco acostumados com o banho

Nenéns, cães de pelo curto ou cães de áreas rurais, são animais que não têm a rotina de um banho e tosa como hábito, e isso faz com que eles necessitem de atenção especial, pois podem nos surpreender de várias formas, desde um pulo ou tentativa de fuga, ou até mordidas por não entender o procedimento. Aconselho que nesses clientes em específico não seja realizado todos os procedimentos de uma só vez. Comece aos poucos. Talvez não seria ideal um banho de várias etapas como hidratações, e coisas que possam aumentam o tempo de procedimento. Tente reduzir o tempo. Quando ele se acostumar e entender que seu dono já vem buscá-lo, você pode incrementar o banho. Em grande parte dos casos esses cães acabam se tornando medrosos por conta de manejo inadequado no banho e tosa.

Medrosos (ou traumatizados)

O que esses cães precisam é de confiança. E nós podemos ensiná-los isso com gestos e ambientes preparados. Se você gosta de trabalhar com música no ambiente, pelo menos nesse momento, evite ou, se preferir, ouça sons leves, suaves que ajudem a relaxar. Cães na espera com latidos ininterruptos podem assustar os que já são medrosos, então tente separá-los em ambientes distintos, pelo menos até que esse cão pare de latir. 

Conversar com o cão também é uma ótima opção! Ele precisa conhecer você. Então, falar com calma e carinho ajudará com certeza! Muitos desses cães têm medo de soprador, então utilizo um mais silencioso. Também temos toucas na cabeça e orelhas deles, para abafar o ruído, e dá muito certo. Mas em casos mais extremos o que funciona é um aconchego no colo com um abraço bem envolvido, daqueles que eles conseguem esconder a cabeça em algum lugar, passando a ideia de segurança. Se ele tem medo de máquina de tosa, deixe ela ligada por um tempo antes de usá-la no animal. E assim que encostar a máquina nele, ofereça carinho. Assim, ele passará a associar carinho ao barulho. Máquinas mais silenciosas também são uma boa opção. 

Mordedores

Pelo menos um cão mordedor durante a nossa puxada semana de trabalho nós iremos receber. Eles adoram nos deixar uma marquinha do seu amor (risos). Faz parte e a gente já sabe, mas se pudermos evitar ao máximo, devemos fazer. Sou muito a favor do uso de focinheiras quando necessário, porém, é preciso ter cuidado com os olhos dos animais. Veja se a focinheira não está apertando os olhos, pois já vi modelos que ficam muito pelo dos olhos e as vezes ate machucam. Sempre que finalizar o uso de uma focinheira limpe muito bem, pois os cães são muito sensíveis a cheiros e na maioria das vezes ela está com vários cheiros de outros cães bravinhos.

Em casos em que o uso da focinheira é impossível, como os cães de focinho muito curto, gosto de usar o colar elisabetano, o famoso “abajur”. Essa dica dá super certo com gatos também. 

A guia de contenção é de extrema necessidade também, pois será uma terceira mão segurando o cão. Certifique-se que a guia está em boas condições para auxiliar na correta posição do cão.

O mais importante é o bem-estar animal e também a saúde do groomer, pois existem casos em que o grau de agressividade é tão alto que é necessário procedimento veterinário como sedação, mas importante salientar, que esse procedimento deve ser feito por um veterinário responsável, onde o tosador estará trabalhando em conjunto. 

Grande porte

Os cães de grande porte nos trazem uma dose extra de exercício físico. Mas preciso salientar que esse trabalho extra deve ser nosso e jamais dos cães. Não deixem que eles desçam de banheiras pulando, ou saltando de bancadas de tosas, pois isso pode ser altamente prejudicial se eles tiverem algum problema de saúde. Se for um cão muito pesado peça auxílio para os movimentos de tirar e colocar. Faça procedimentos que eles podem não gostar quando o cão ainda está no chão, pois iniciar um corte de unha onde o cão não está a fim e em cima de uma bancada, é perigoso. 

Considerações finais

Esteja sempre atento a todos esses cães e casos peculiares. Nós, tosadores, lidamos com materiais cortantes que podem ferir o animal ou o profissional se mal manuseados. A atenção é necessária, pois uma simples virada de cabeça inesperada pode ferir um ou outro. O diálogo com o dono é crucial, ele precisa saber como é o temperamento do seu cão, quais são as dificuldades. Muitas vezes queremos agradar o cliente dizendo que o cão é um anjo, quando na verdade ele é superagitado. Se você fala algo assim para seu cliente e um dia acontecer algo, não adianta falar depois que o cão era impaciente, pois o dono nunca recebeu esse feed. Então seja sempre honesto com seu cliente, diga a real condição do animal. Se você não se sentir seguro para realizar os procedimentos nesses cães sozinho, peça ajuda a alguém. Se não se sente capaz, não o faça. 


Por Camila Caetano

Há 16 anos no ramo pet, possui formação em marketing e pós-graduação em Gestão de pessoas aplicada em ministração de cursos na área pet há 12 anos.
Competidora com premiações, juíza convidada em eventos de grooming e palestrante nacional e internacional, onde apresenta as técnicas desenvolvidas em sua escola de banho e tosa localizada em Campinas-SP – a Art Groomer Escola de Banho e Tosa (artgroomer.com).


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